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31 de agosto de 2017

Goethe e a Solidão: Antonio Rodrigues




“Quando sentimos falta de nós mesmos, falta-nos tudo.”

Outro dia reli o clássico “Os sofrimentos do jovem Werther”, de J. W. Goethe, a procura da frase acima, que o meu esforço de memória não me havia feito recordá-la com precisão. A certa altura, finalmente, a encontrei na página 75 da 6ª edição da editora Estação Liberdade.

A pós-modernidade, de certa forma, nos roubou a experiência da solidão. E não só nos roubou como nos legou uma verdadeira ojeriza, um inaudito pânico da solidão. A solidão vista assim é um mal a ser evitado, preenchido com mil coisas, pois ela pode nos levar a experiência da depressão (?).

Mas o que seria a solidão? Em abordagem sobre o tema, a Revista Superinteressante traz a fala do psicólogo existencial Jadir Lessa, que recorre a Heidegger:

“O filósofo alemão Martin Heidegger (1889-1976) afirma em Ser e Tempo que estar só é a condição original de todo ser humano. Que cada um de nós é só no mundo. É como se o nascimento fosse uma espécie de lançamento da pessoa à sua própria sorte. Podemos nos conformar com isso ou não. Mas nos distinguimos uns dos outros pela maneira como lidamos com a solidão e com o sentimento de liberdade ou de abandono que dela decorre, dependendo do modo como interpretamos a origem de nossa existência. O homem se torna autêntico quando aceita a solidão como o preço da sua própria liberdade. E se torna inautêntico quando interpreta a solidão como abandono, como uma espécie de desconsideração de Deus ou da vida em relação a ele. Com isso abre mão de sua própria existência, tornando-se um estranho para si mesmo, colocando-se a serviço dos outros e diluindo-se no impessoal. Permanece na vida sendo um coadjuvante em sua própria história.”

Não quero aqui definir nada sobre essa questão complexa da solidão. Quero apenas provocar-lhes uma reflexão. Será que a pós-modernidade nos fez chegar ao ponto de sentirmos falta de nós mesmos? E sentir falta de nós mesmos seria a expressão máxima do vazio existencial? 

Antonio Rodrigues
Deixo aqui outro belo fragmento de "Os sofrimentos", na página 22 da edição citada, uma contribuição da literatura à reflexão sobre a urgente questão da solidão, uma questão do nosso tempo , mas também  uma questão intemporal do homem. Um possível encontro de "si consigo mesmo", e daí um encontro fecundo com o mundo:  

"Volto-me para dentro de mim mesmo e encontro um mundo! Mais de pressentimentos e desejos que de raciocínios e forças vitais. E então, tudo flutua ante meus olhos, sorrio e sonhando penetro ainda mais neste mundo."


4 comentários:

  1. Que texto bom, Antônio. Li esse livro há muito tempo, mas não tinha refletido sobre o tema da solidão. Interessante!

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  2. Ótimo teto, Antonio. Estava com saudades de ler algo seu. Excelente reflexão. Vou ficar matutando. Grande abraço.

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  3. Quanta beleza e verdade!Veio bem na hora em que fazia um haicai retratando meus vazios. Obrigada meu sensível amigo! Ofereço-o a você.

    Espaços enormes
    definem os meus vazios...
    Só,nem sei quem sou!

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