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31 de dezembro de 2015

A Caixa Preta: Amós Oz


"Que tipo de amor é este?"




"A maldade gélica que emana de você como um brilho polar azulado e que o tornou odioso ao ponto da histeria para as outras moças do batalhão - foi isso que prendeu meu coração. Seu ar de domínio indiferente. A crueldade que emana de você como um perfume. O cinzento dos seus olhos, como a fumaça do seu cachimbo. A ferocidade cortante de sua língua diante de qualquer sinal de oposição. O seu prazer de lobo com o prazer que impunha. O desprezo que sabia  emitir como um lança-chamas, e disparar num jato causticante sobre seus companheiros, seus subordinados, no grupo de secretárias e escreventes, que sempre ficavam petrificadas na sua presença. Como enfeitiçada, fui atraída para você das profudidades lodosas da subserviência feminina ancestral, uma servidão anterior às palavras..." p. 167




Hermosa Beach, 5 de novembro de 1983

                                                                                                                          Mãe,

     Se D'us me pedisse opinião sobre qual deveria ser a ordem de acontecimento das coisas na minha vida, eu certamente apresentaria um plano completamente diferente do que Ele fez acontecer e ainda anda fazendo, claro. Eu apresentaria um plano certinho, coerente, lógico. Mas D'us botou no lixo o meu certinho, tornou incoerente a ordem dos acontecimentos segundo meu ponto de vista, segundo a minha lógica. Será porque D'us prepara riquezas inimagináveis para seus filhos? Será porque a minha lógica apenas me encerraria num mundo menor do que aquele que Ele reserva para mim? Será porque, dentre os seus filhos, Ele escolhe aqueles com quem acha ser divertido brincar e dar-lhe toda sorte de acontecimentos, descarregar sobre ele Seu amor e Seu ódio? Ou talvez D'us esteja apenas querendo me ensinar que a verdadeira felicidade segue outro rumo que aquele que eu poderia desejar para mim mesmo.

...

Todo amor da filha,

                                                                                                                          M.Y.


Volteemos um pouquinho no tempo:


para onde ele olha, o que vê?

os olhos bebem brilho e sombra.

quais palavras mal pôde exprimir
- verdade, novela, incenso - 

antes que o repouso dos lábios
dissessem silêncio, e antes espera?

que ideias pressionam agora
por dentro, o crânio? quase posso

com a ponta dos dedos, tocá-las:
uma censura, uma saudade bem física.

na parede ao fundo, a  imagem
a mesma dos últimos vinte ou trinta

anos, uma expressão, apenas
algo que talvez pudesse legar de si.

os braços tentáculos, extensão
daqueles quase mouros (na infância

pendurávamos neles o corpo
no cipó dos pelos resistentes, nas mãos

ásperas de polegares diferentes).
o traje folgado, a tensão no cinto
de onde vem, para onde vai...
ah, o futuro, os passos miúdos no chão

se chegou, quem sabe? quem diz
o que será depois dos 80?

                                                                                                                            d.


Niterói, 5 de Abril de 1981

                                                                                                                    Mamãe,

     Como vai você e como vão todos aí? Tudo O.K. com o Boaz, tudo odara com titia, tudo final de linha com Alec, tudo gostoso com a merência e tudo tranquilo com você? Tem tomado guaraná? Ou pelo menos tem sonhado com alguém te dando guaraná? E a coluna, tem alguém aí fazendo do-in nela para ela ficar duim-duim-duim? E o cigarro, diminuiu? O quê, parou? Esplêndido! Não, sonhar que está fumando não faz mal.

...

                                                                                          abraços e beijos da filha

                                                                                                                           M.Y.


Saúde
           Força
                      Coragem
                                     Ânimo
                                                Graça
                                                           e
                                                              Beleza

Pra você, com muito amor.


* * *


Colinas de Golã, 12 de Maio de 1982 - quarta feira

I,

...

     Mas agora é olho de águia e ouvido de coelho. Aproveito o exceço de tempo com pequenas utilidades e lendo alguns livros que há muito pensava ler mas o estudo escolar impedia. Aos poucos vou vencendo as iluzões.

     O que nos enche de alegria aqui no kibutz é saber que estamos livres da mesquinhez e dos mechericos conjugais que enfrentávamos nos sommos. O que nos enche de determinassão para a luta é a decizão de que este kibutz é um pouzo provizório.

Saudassões,

Boaz


* * *


Leia +

Veja a entrevista que Amós Oz deu à TV Cultura


Os votos: Sérgio Jockymann




“Pois desejo primeiro que você ame e que amando, seja também amado.

E que se não o for, seja breve em esquecer e esquecendo não guarde mágoa.

Desejo depois que não seja só, mas que se for, saiba ser sem desesperar.

Desejo também que tenha amigos e que mesmo maus e inconsequentes sejam corajosos e fiéis.

E que em pelo menos um deles você possa confiar e que confiando não duvide de sua confiança.

E porque a vida é assim, desejo ainda que você tenha inimigos, nem muitos nem poucos, mas na medida exata para que algumas vezes você interpele a respeito de suas próprias certezas.

E que entre eles, haja pelo menos um que seja justo para que você não se sinta demasiadamente seguro.

Desejo depois que você seja útil, não insubstituivelmente útil, mas razoavelmente útil.

E que nos maus momentos, quando não restar mais nada, essa utilidade seja suficiente para manter você de pé.

Desejo ainda que você seja tolerante, não com que os que erram pouco, porque isso é fácil, mas com aqueles que erram muito e irremediavelmente.

E que essa tolerância nem se transforme em aplauso nem em permissividade, para que assim fazendo um bom uso dela, você dê também um exemplo para os outros.

Desejo que você sendo jovem não amadureça depressa demais, e que sendo maduro não insista em rejuvenescer, e que sendo velho não se dedique a desesperar.

Porque cada idade tem o seu prazer e a sua dor e é preciso deixar que eles escorram dentro de nós.

Desejo por sinal que você seja triste, não o ano todo, nem um mês e muito menos uma semana, mas um dia.

Mas que nesse dia de tristeza, você descubra que o riso diário é bom, o riso habitual é insosso e o riso constante é insano.

Desejo que você descubra com o máximo de urgência, acima e a despeito de tudo, talvez agora mesmo, mas se for impossível amanhã de manhã, que existem oprimidos, injustiçados e infelizes.

E que estão à sua volta, porque seu pai aceitou conviver com eles.

E que eles continuarão à volta de seus filhos, se você achar a convivência inevitável.

Desejo ainda que você afague um gato, que alimente um cão e ouça pelo menos um João-de-barro erguer triunfante seu canto matinal.

Porque assim você se sentirá bom por nada.

Desejo também que você plante uma semente por mais ridículo que seja e acompanhe seu crescimento dia a dia, para que você saiba de quantas muitas vidas é feita uma árvore.

Desejo, outrossim, que você tenha dinheiro porque é preciso ser prático. E que pelo menos uma vez por ano você ponha uma porção dele na sua frente e diga: Isto é meu.

Só para que fique claro quem é o dono de quem.

Desejo ainda que você seja frugal, não inteiramente frugal, não obcecadamente frugal, mas apenas usualmente frugal.

Mas que essa frugalidade não impeça você de abusar quando o abuso se impor.

Desejo também que nenhum de seus afetos morra, por ele e por você. Mas que se morrer, você possa chorar sem se culpar e sofrer sem se lamentar.

Desejo por fim que, sendo mulher, você tenha um bom homem e que sendo homem tenha uma boa mulher.

E que se amem hoje, amanhã, depois, no dia seguinte, mais uma vez e novamente de agora até o próximo ano acabar.

E que quando estiverem exaustos e sorridentes, ainda tenham amor pra recomeçar.

E se isso só acontecer, não tenho mais nada para desejar”




26 de dezembro de 2015

Livro: Tocaia Grande- a face obscura, de Jorge Amado


Olá queridos!
Vou reproduzir o post que fiz no meu blog Mar de Variedade.

Finalmente consegui concluir essa leitura do mês de novembro do Clube de Leitura Icaraí.
Gosto muito do autor Jorge Amado e sou leitora de seus livros desde a adolescência. 

Sinopse (Livraria da Travessa): "Em Tocaia Grande, Jorge Amado descreve o processo de formação de uma cidade nordestina nascida sob o signo da violência e da disputa de terras. Romance caudaloso e panorâmico, revela a “face obscura” de um lugar em que a lei não vigora nem há presença formal do governo.
Na região cacaueira, a pequena cidade de Irisópolis é o microcosmo de uma sociedade de funcionamento tradicional e arcaico, que recebe os ventos da modernização sem perder a herança perversa. Apesar do progresso, da emancipação e dos elementos civilizatórios, o lugar vai conservar seus traços originais: o sangue derramado, a marca do pecado e a memória da morte."



Nesse livro, podemos ver a formação de uma cidade, que começa com a transferência de terras ao jagunço Natário da Fonseca pelo Coronel Boaventura, após uma tocaia naquele mesmo lugar. 
Jorge Amado consegue descrever muito bem, com muitos detalhes, todo o crescimento desse povoado até se transformar em uma pequena cidade do Nordeste.
O autor utiliza a linguagem regional, mas, pelo contexto, consegue-se entender. Quem não conseguir, pode buscar o significado no google. 
É um livro de pouco mais de 400 páginas, em que é contada a história dos habitantes daquele lugar, desde romances, plantio do cacau, o comércio local, a vida fora da lei dos jagunços, a vida das prostitutas que também moravam em Tocaia Grande.
A história consegue passar também que, apesar da prática de crimes, a mando dos coronéis, os jagunços também tinham ética entre eles e que a vida fora da lei não necessariamente significava que seriam pessoas desumanas quando estivessem em seu dia a dia. 
Enfim, é muito interessante ver uma pequena cidade começar, e Jorge Amado consegue fazer isso muito bem nessa obra.
Boa leitura!

2 de dezembro de 2015

Parabéns Astrônomos!


Felizes astrônomos... 
Viajam suas infindáveis estradas escuras pontilhadas de luz. 
Passeiam pelo infinito azul-negro-profundo 
como o veludo do meu vestido de gola de renda de Racine bege 
que tinha flores bordadas no lugar de estrelas.

(Ilnéa)

Foto: Carlos Fairbairn - Fonte G1


2 de dezembro

Dia do Astrônomo