Fundado em 28 de Setembro de 1998

30 de novembro de 2012

SE MORRER, NÃO MORRE MAIS

Curiosa essa morte em pedaços
Essas punhaladas à prestação
Essa negação que nunca chega
Mas sempre vem.

Inusitado esse espancamento reincidente
Em petelecos insistentes
– aqui morro mais em verbos pretéritos
Do que em substantivos presentes.

Reveladora essa morte que não pode jamais morrer
Porque o fim precisa estar bem vivo e rendendo,
Cultivado a cada dia como profissão de fé, tortura
Que se certifica de um eterno morrendo.

novaes/

27 de novembro de 2012

Somos o CLIC

Você faz parte do time que nunca ou raramente fala nas reuniões do Clic ou que pouco escreve nos e-mails do grupo? Se sim, esse post foi feito pensando em você, a princípio. Depois das respostas, sei não, talvez quem sempre fala ou escreve lucre ainda mais com sua leitura. 

Segue uma entrevista que, para mim, foi tão surpreende quanto reveladora e, sobretudo, muito interessante. Quando a gente acha que conhece um pouco alguém, descobre que na verdade - falo do meu caso, naturalmente -, projeta muito de nossas tolas crenças em tantos ‘alguéns’..., mas como tudo vale a pena se a alma não é pequena, segue junto com a entrevista o meu pedido de desculpas pela presunção de não ter antes admitido: eu só sei que nada sei. 

Com vocês, a fala sensível e inteligente de Cintia.

By: Rita Magnago



Como é ser um leitor assíduo nas reuniões do Clic e raramente falar sobre o livro do mês?

Cintia: Eu acho que deveria ficar sem jeito de não participar com comentários (embora não fique), mas entendo que aquele espaço da EdUFF é para falar e ouvir. Se não falo é por que estou lendo as pessoas, aprendendo com elas, curtindo o que acontece. Seja através da recepção de ideias novas, seja por meio do exercício de discordar (mesmo silenciosamente) de uma exposição, ou ouvir um pensamento meu ser exposto de modo diferente do que você o faria.  


Na hora que alguém está lá dando uma opinião bem diferente da sua ou falando exatamente o que você pensa, não dá uma coceirinha, uma vontade de pegar o bastão da fala e botar a boca no trombone?

Cintia: Às vezes sim, às vezes não. Penso ser produtivo quando você consegue apresentar uma visão diferente como contraponto, não como uma correção do que outra pessoa diz (por mais que você discorde da opinião que ouve). A menos é claro que seja algo que fuja a opinião e seja uma informação não verídica. Se acho que consigo fazer o contraponto e se o ambiente é propício (há tempo suficiente para aprofundar o assunto, tem gente querendo escutar, etc) então vale a pena. Por outro lado, também é bem legal quando a gente exercita o controle dessa "coceirinha". Às vezes temos mania de rebater o que ouvimos sem pensar direito. Ou temos tanta necessidade de falar, que não percebemos repetir o que já foi dito.


Que tipo de comentário do livro você mais gosta de ouvir? Análise literária? Textos destacados do livro? Curiosidades sobre o autor ou a obra? Experiências pessoais que os frequentadores relatam ter se lembrado a partir da leitura? Outros?

Cintia: Gosto de ouvir o que não tinha passado pela minha cabeça e que me parece viável. Aí sinto que estou aprendendo. Acho que o que gosto de ouvir não necessariamente se encaixa em um determinado tipo de comentário. É bom ouvir uma pessoa dizendo sobre o quanto a leitura a emocionou, mas se passarmos as 2h de reunião ouvindo todos dizerem isso, sairemos decepcionados de lá. Assim, o lado eclético do grupo é bem interessante, pois cada um aborda o que foi de seu interesse. Se quero ouvir certa abordagem (a análise psicológica, ou política, por exemplo) e os comentários estão voltados para assuntos diferentes (estrutura do texto, vida do autor, por exemplo) nada melhor que eu mesma tente fazer minha abordagem e, com isso, estimule outros que tenham interesses semelhantes a se manifestarem.



Já aconteceu de você não ter gostado muito de uma leitura e ter mudado de opinião após ouvir os comentários dos demais colegas?  Se sim, qual foi o livro e como foi a experiência?

Cintia: Hmm... acho que não. Mas lembro que quando discutimos "Alvo Noturno" em outro Grupo, achei que o pessoal não conseguiu aproveitar tanto o livro. No Clube de Leitura a discussão foi bem mais rica, o que, é claro, tornou o livro mais interessante.

Com relação aos comentários por escrito no e-mail do grupo, o que você mais curte e o que não gosta?

Cintia: Não vejo o Clube no Google Gmail como uma rede de relacionamentos, mas como um espaço para se trocar informações sobre livros e leituras. Assim, não gosto muito de excesso de propagandas, de fofocas, indiretas que visam atacar terceiros, militâncias de ideias, grosserias, excesso de vaidades e outras coisas que não me vem à cabeça agora. É claro que tudo isso é demasiadamente humano e faz parte do aprendizado de pertencer a um grupo.


Se fosse possível sintetizar em uma frase a experiência de ler e participar do debate de um bom livro, o que você diria?

Cintia: Participar do Clube de Leitura é um aprendizado.


24 de novembro de 2012

Votações perdidas?

Foto gentilmente cedida por Elô. Retrata a votação de Lolita,
que perdeu para "As nuvens", livro de dezembro

Fazemos parte de um clube democrático, que escolhe os livros em debate durante as reuniões mensais, a partir dos mais votados no Blog do Clic e no clube no facebook. Isso é ótimo, com certeza, mas, algumas vezes, os livros que perdem são tão bons...

Embora todos temos a possibilidade de ler o que bem quisermos, o hábito de debater um livro já está tão enraizado que muitos sentimos falta. Então esse post propõe que falemos dos livros que perderam as votações.

Abaixo segue uma pequena relação. Se você já leu algum desses livros, comente, dê sua opinião, exercite o direito de bem influenciar o próximo.

ü       Coração das Trevas - Joseph Conrad
ü       A Tentação do Impossível, Vitor Hugo e Os Miseráveis - Mário Vargas Llosa
ü       Madame Bovary - Gustave Flaubert
ü       Precisamos falar sobre Kevin - Lionel Shriver
ü       O Livro dos Seres Imaginários - Jorge Luis Borges
ü       No Vale de Ossos Secos - Mike Sullivan
ü       Jerusalém - Gonçalo M. Tavares
ü       De verdade - Sándor Márai
ü       O Caderno de Maya - Isabel Allende
ü       Rumo ao Abismo? Um Ensaio sobre o Destino da Humanidade - Edgar Morin


P.S 1: Nosso concièrge tem mantido os ‘perdedores’ na lista de indicações futuras e eles estão sempre na concorrência, junto com novas indicações.

P.S 2: Esse ano já foi lido Homem Comum, de Philip Roth, e em janeiro será debatido Vermelho Amargo, de Bartolomeu Campos de Queirós, ambos os livros perderam numa primeira votação.

22 de novembro de 2012

Homenagem aos amantes da literatura



"Tudo ressoa, mal se rompe o equilíbrio das coisas. As

árvores e as ervas são silenciosas: se o vento as agita,

elas ressoam. A água está silenciosa: o ar a move, e ela

ressoa. As ondas mugem: é que algo as oprime. A cascata

se precipita: é porque falta-lhe solo. O lago ferve: algo o

aquece. Os metais e as pedras são mudos, mas ressoam

se algo os golpeia. Assim também o homem. Se fala, é

porque não pode conter-se. Se se emociona, canta. Se

sofre, lamenta-se. Tudo o que sai de sua boca em forma

de som se deve a um rompimento do seu equilíbrio... A

palavra é o mais perfeito dos sons humanos; a literatura,

por sua vez, é a mais perfeita forma de palavra. E assim,

quando o equilíbrio se rompe, o céu escolhe entre os

homens os que são mais sensíveis e os faz ressoarem"


Texto do poeta chinês do século VIII, Han Yu, reproduzido em artigo de João Silvério Trevisan publicado na revista Vozes, de 1997, contribuição de nossa querida Elenir.

20 de novembro de 2012

Clube do Conto - Caça: Carlos Rosa Moreira



Vi quando o moleque arrancou a bolsa dos ombros da senhora e quase a derrubou no chão. Foi muito rápido. Veio na corrida, abocanhou a bolsa e continuou correndo. Esgueirou-se entre pernas e automóveis. Quando a mulher gritou, ele ia longe, fora das vistas indiferentes dos que passavam, mas não da minha. Eu esperava por uma oportunidade dessas. Andava pelas ruas observando, atento à movimentação dos moleques. Apalpei a meia trinta e cinco oculta no cós: teria de chegar perto, bem pertinho... E teria de ser num lugar de pouco movimento.

Não perdi de vista o pixaim descolorido pela água oxigenada. Ele entrou por uma rua, saiu em outra; deu a volta no quarteirão movimentado, se misturou às pessoas, parou na porta de uma galeria. Da loja de discos ao lado, vinha o som de um pagode cantado por um sujeito de voz pastosa; na calçada, camelôs anunciavam seus produtos criando uma insuportável algaravia. O moleque observou tudo durante um tempo, depois foi andando. Ia devagar, esperto, tinha o punho esquerdo fechado à altura do peito, com a mão direita espalmada dava umas pancadinhas no punho fechado como se marcasse um ritmo. A todo momento se voltava, sua visão era de trezentos e sessenta graus. Dobrou a esquina deixando a rua principal e seguiu em direção à praia.

Duas meninas com uniforme escolar vinham pela calçada. De longe, vi quando ele as interpelou. Ameaçava-as com um caco de vidro. Pegou uma mochila colorida, apoderou-se de uma bolsinha, arrancou um reloginho, mas a mão de um senhor acertou em cheio no seu pescoço. Do jeito que caiu se levantou, e antes que um pontapé o pegasse, já estava longe. Parei para ajudar a procurar o reloginho caído no chão. Isso me fez perder o moleque de vista. Dei voltas pelos quarteirões e, após cortar várias ruas, vi uma mulher que tentava estacionar numa vaga apertada. O flanelinha sinalizava com a mão para ajudá-la. Era ele. Parei na esquina, apalpei a calça; a rua era muito calma, um lugar interessante...

Quando a mulher terminou a manobra e abriu a janela para lhe dar uma gorjeta, ele a assaltou com o caco de vidro. Pegou a bolsa que a mulher entregou, remexeu dentro, tirou o que queria e jogou a bolsa no chão. Corri para alcançá-lo, mas um porteiro também correu. Dois rapazes apareceram e foi uma gritaria danada que reverberou naquela rua cercada de prédios. O moleque parecia uma gazela. A perseguição atravessou duas esquinas, mas, de repente, ele sumiu. Os rapazes e o porteiro retornaram enraivecidos e excitados.

Eu continuei. Passei um quarteirão, passei outro. Quando ia cruzar a terceira esquina, levei uma trombada que, por pouco, não me derrubou. Aos meus pés, apavorado, o moleque se arrastava para um vão de parede. O nariz sangrava, tinha os olhos arregalados e tremia. Levou o indicador à boca, ia implorar alguma coisa. Enfiei a mão dentro da calça e senti o contato com o metal morno. Segurei a pistola já com o dedo no gatilho, mas uma barulheira de vozes intimidou meu gesto. Um grupo de rapazes mal-encarados vinha em nossa direção. O da frente quase era arrastado por um cão pitbull.

O moleque fez cara de choro, implorou socorro com os olhos esbugalhados. Olhei o medonho grupo que se aproximava, olhei o moleque; antes que eu pudesse pensar qualquer coisa, ele se levantou e correu. Ao atravessar a rua, levou um trompaço de uma bicicleta que vinha na contramão, jogando-o a mais de dois metros. Os rapazes e o pitbull o alcançaram ainda no chão. Não o vi mais. Também não vi o pitbull que se enfiou na confusão de pernas que chutavam e pisavam. Ouvi uns gritos de terror, mas foi coisa ligeira.

Ajeitei a meia trinta e cinco no cós, virei as costas e fui andando. Lembrei-me de um filme. Havia uma cena em que um atobá mergulhava e pescava um peixe que não parava de se debater em seu bico. E o peixe tanto se debateu que se soltou em pleno ar, mas antes que chegasse à água, foi capturado por uma gaivota que vinha num rasante.

Retornei à rua principal e fiquei no meio daquele movimento de gente para lá e para cá. Divaguei um pouco, observando as pessoas. Até que vi, sentadinho no mármore da entrada de uma padaria, o moleque de pixaim descolorido. Os olhinhos espertos observavam em trezentos e sessenta graus, as mãozinhas magrelas marcavam um ritmo nervoso batendo palmas sem som.


Clube da Crônica - Uma Velha Amiga: Carlos Rosa Moreira



            Lá vem ela. Vamos passar um pelo outro novamente. Vamos nos reconhecer, mas vamos fingir que não. De longe já sabemos que o outro vem vindo, e sentimos, talvez, a mesma expectativa desagradável de fingimento.

            Por que não nos falamos? Passou tanto tempo sem que nos encontrássemos... Disseram-me que ela havia se mudado para o norte com os pais. Qual não foi minha surpresa quando a vi nessas ruas, já mulher feita, mas com o mesmo brilho sapeca no olhar. Aí não nos falamos da primeira vez; e assim ficamos. Será o tempo que apaga tudo? Apaga até uma amizade?

          Lá vem ela. Vai haver aquele olhar de quem não olha, meio enviesado entre duas piscadelas. Depois continuaremos em nossas direções com a impressão enjoada de que um deveria ter falado com o outro.

            Lá vem. Está atravessando a Presidente Backer. Nos encontraremos em frente ao Banco do Brasil. Continua magra, espigada, bonita. É mais velha do que eu, mas parece tão jovem. O andar é igual ao de quase quarenta anos atrás. Andar de pernas compridas, mas de passos curtos e rapidinhos. Lembro-me dessas pernas dentro de uma minissaia quadriculada, lá naquela rua, nossa rua. Haja tempo...

            Lá vem ela. O mesmo olhar oblíquo para baixo, os mesmos braços cruzados sobre o peito. Vem ligeirinha e decidida, passará por mim agora...

            ‒ Oi, Emília!

            Assustei-a. Tirei-a de sua contemplação oblíqua, impedi-a de sentir a costumeira impressão enjoada ao passar por mim. O brilho sapeca me fitou. Fui recebido por um sorriso resplandecente, ainda levemente dentucinho. O mesmo de antes; sorriso rasgado e luminoso de olhos e boca.

            ‒ Oi, Carlos!

            ‒ Como eu desejava falar com você! Afinal, não é direito amigos de infância se cruzarem e não se cumprimentarem.

            ‒ Eu também sempre tive vontade de falar com você!

            ‒ Você continua bonita, Emília.

            ‒ E você não mudou nada. Tá bastante charmoso com esses cabelos grisalhos.

            ‒ Precisamos conversar, contar nossas histórias qualquer hora dessas.

            ‒ Ah, passe em minha loja, é aquela ali, tá vendo? Vamos conversar, não deixe de passar.

            ‒ Passarei, prometo.

            E com beijinhos e sorrisos nos despedimos, continuando, cada um, em sua direção. Ainda nos demos um “té logo” à distância, que foi como se firmássemos o prazer pelo encontro.

            Foi muito bom ter falado com a minha velha amiga. É uma amiga, guarda muitos olhares, sorrisos, conversas, imagens de um tempo singelo e feliz. É como uma foto rara. Não poderia deixá-la por aí.

19 de novembro de 2012

A Paixão segundo F. G.: Homenagens


Partistes, Fred querido,
nos deixastes cedo ainda,
mas não hás de ser seguido
por tua presença infinda.

Sei que através da saudade,
a ausência não sentiremos,
pois tua doçura e amizade
no coração nós traremos.

(Segundo Elenir)

* * * 

Segundo Lilian

* * *

Não sei falar da morte sem dor
não há morte sem dor
mas se a vida em si for alento
digo ao Fred cujo sorriso
é marca do meigo
que a graça de seu encanto
segue conosco agora
e mesmo no pranto
canta mais alto a emoção
de tantos encontros
entre livros, entre amigos
palavras tocadas
olhares trocados
simbiose, transformação
segue a alma o percurso
trilhado antes por seu coração.
Descanse em paz.

(Segundo Rita)

* * *

Segundo Elô, com o "bastão da fala" a pedido de F.G.  


* * *


Como se fosse um recado seu, Fred...

Tudo fica tal qual antes,
antes mesmo de nascermos,
lembrarmos, como elefantes,
do lugar onde morrermos. 

como se fosse...
I


17 de novembro de 2012

Estamos nas nuvens: Rita Magnago


Bom sábado, pessoal

Estamos lendo "As nuvens" e eis que me deparo hoje, no Caderno Prosa (infelizmente agora só, onde foram parar meus versos?) , com matéria sobre a escritora moçambicana (salve Mia Couto) Paulina Chiziane, que ficou internada uma semana em uma clínica psiquiátrica.
Conta a autora que tinha crises de calor e frio intercaladas com vertigens e que ouvia vozes, o que fazia com que falasse sozinha horas e horas e, durante a noite, não conseguisse dormir. Na clínica, ela entrevista outras mulheres com as chamadas alucinações, incluindo uma entendida em espiritismo, que vem a ser sua parceira no livro, e escreve o que os críticos dizem estar no limite entre literatura e paraliteratura, por tangenciar, em sua escrita influenciada pela oralidade e costumes africanos, esse universo dos espíritos. Ao fim e ao cabo a autora declara: "Foi um exercício psicológico interior muito grande e, mesmo assim confesso: acho que vão dizer que enlouqueci de vez."

Fascinante essa fronteira da loucura, até que ponto vai o que convencionamos chamar de normalidade e que tantas vezes é muito mais louco que a loucura em si. Há um preconceito gigantesco com as doenças mentais que nos faz inclusive optar pelo distanciamento destes enfermos, mas a loucura usa e abusa da razão. Como nos lembra Saer na página 135, "Todos os atos de um louco, por nímios ou absurdos que pareçam, são significativos" ou ainda na página 146, quando diz que é a razão que engendra a loucura.

Saer dialoga ainda com Clarice, e tantos outros, quando fala do medo que temos pelo que não conhecemos ou entendemos, como bem destacado no trecho abaixo, da página 146.

"E quanto à impossibilidade que o senhor assinala de conhecer os pensamentos de um colibri ou, se prefere, de um cavalo, quero sublinhar que frequentemente acontece a mesma coisa com nossos pacientes: ou eles prescindem da linguagem ou tergiversam com ela, ou utilizam uma linguagem de que só eles conhecem o significado. De modo que, quando queremos conhecer suas representações, descobrimos que são tão inacessíveis para nós quanto as de um animal desprovido de linguagem".

Esse livro, em minha opinião, joga luz sobre o sombrio em nós que renega o que foge a parâmetros socialmente aceitos justamente porque seus atores não foram socialmente aceitos. Valeu a dica, Ceci.

Abraços a todos,

Rita

P.S1 : Aproveito para convidá-los a rir um pouco com meu novo post. Tem uns quadrinhos muito bons. É só acessar abaixo.


P.S2: Para quem quiser ler a matéria com a moçambicana, segue o link.


Última atualização do blog: 17/11/2012
Confira em http://ritamagnago.blogspot.com.br

15 de novembro de 2012

Preciso de você: Elenir




Somente, agora, descubro
minha grande pequenez.
Não mais encontro a heroína,
sua  determinação,
supostas força e coragem.  
       
Tenho medo... Estou só...
A solidão me enlaça.
Preciso de tua mão.
Ajuda-me a caminhar!
Aquieta meus  sentidos!

Vem preencher meus vazios
e suprir nossas carências!
Seguindo, juntos, amor,
golpeados pela graça,
a paixão descobriremos.

(Inspirado no livro A Paixão Segundo G.H. – Clarice Lispector)


8 de novembro de 2012

Haicais inspirados em Virginia Woolf



À brisa da noite,
macias pétalas curvam-se
e o jardim agíta-se.

Se me tocas tremo,
tal qual treme a erva no mar
ao toque do remo.

Beijos. Elenir

7 de novembro de 2012

Clube do Conto - Verde olhar: Carlos Rosa Moreira



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Ah, moça dos olhos verdes que vem e que passa balouçante e graciosa a caminho do calçadão. Vai correr, eu sei. Vai correr como correm ‒ e como correm! ‒ essas moças de hoje: atléticas, espartanas, germânicas, douradas. Ah, dourada moça dos olhos verdes, por que cravas em mim essa íris cor de folha? Eu que já não corro, só ando?

Verdes íris que gosto de ver. Parecem as folhas das amendoeiras deste inverno: verdes com áureos laivos. Não sei o que vês quando me olhas, mas me sinto bem adjetivado.

Qualquer dia desses, procuro o meu velho livro de ginástica calistênica dos pilotos canadenses e me ponho em forma. Fico só imaginando no que pensarás ao me ver ligeiro, ligeiro trotando ao teu lado. Apressarás o passo? Darás um sorrisinho de verdes olhos convidativos? Não sei... Talvez o melhor não seja correr, e sim, andar. Andar para só cruzar por ti, e poder sentir, livre, livre, esse verde olhar.


6 de novembro de 2012

Musa da “quase” terceira idade: Wagner Medeiros



Foi de um grande amigo, Sr. Gercino, de quem ouvi que lá no sul da divisa entre o Espírito Santo e o Rio de Janeiro, em Ponte de Itabapoana, o Sr. Ézio Moraes facilmente teria enriquecido, se desonesto. Fiscal de renda do estado, na época mal remunerado, não transigia em sua conduta na defesa dos interesses do erário.

Não tive a felicidade de conhecer o Sr. Ézio, mas me tornei amigo de sua esposa, dona Hélia, e da família, poucos anos depois da sua viuvez. Até então, dona Hélia vivia exclusivamente para os afazeres do lar. Assim, educou os três filhos, numa vida que seria plenamente sem preocupação, se não fosse o Sr. Ézio passar do ponto, de vez em quando, no divertimento da sua bebidinha.

Depois de viúva, dona Hélia não entregou os pontos, mas repelia de todas as formas qualquer insinuação de namoro ou casamento. Pensava-se eternamente viúva: - Homem? Só os meus dois filhos; de pensar me arrepia! Porém, não faltavam os pretendentes, porque Ela tornou-se uma “coroa” muito bonita.

Solitária em Ponte de Itabapoana, com os filhos casados, distantes, dona Hélia resolveu praticar natação. O primeiro passo foi aprender a dirigir, para não depender de ônibus, com poucos horários e uma eternidade para chegar a Bom Jesus do Itabapoana. E assim fez: aprendeu a dirigir, matriculou-se na natação, tomou gosto pela piscina e voltou à forma de pelo menos 15 anos atrás.

Só depois de 18 anos de viúva, entretanto, que dona Hélia aceitou a divertir-se com algumas amigas, que insistiam em levá-la ao baile da terceira idade. Lá começaram a “chover” os pretendentes e Ela sempre escapulindo, sempre dando o fora...
Até que um dia Adeir - que havia deixado para trás o estresse do Rio de Janeiro – encontrou-a desprevenida num desses bailes, em uma harmonia imensa nos passos da dança. De início ainda houve um pouco de resistência, mas a educação e o cavalheirismo foram tão verdadeiros que não houve jeito.

Depois de algum tempo, dona Hélia viu que sua decisão foi realmente acertada: cafezinho na cama; galinha caipira com quiabo e polenta; horta bem tratada no fundo do quintal; o paladar da comida conquistando seus filhos; Adeir sendo disputado! Na retribuição de todo carinho, Adeir passou a chamar-se Deí. 

(Eu sou testemunha de que a culinária do Deí é realmente muitíssimo elogiada. Tudo é feito com paciência e capricho. O molho a vinagrete do churrasco é sem igual, com os ingredientes cortados à mão, miudinhos e uniformes.

Só que em cidades pequenas há sempre os despeitados e invejosos. E muitos se sentiram incomodados com o sucesso do Deí junto à dona Hélia.

Nozinho, sujeito folgado e baixinho, com seu chapéu de cowboy e canivete preso na cinta, ex-fazendeiro (atualmente vive a expensas da aposentadoria da mulher), diz-se amansador de mula brava e montador de burro empacado, viu Deí atravessar a rua. Esperou que chegasse ao portão para passar um embrulho à sua musa, quando então gritou: - Adeir, seu b.. mole!

Deí ficou transtornado: - Hélia, eu vou atravessar a rua e vou dar uma surra nesse camarada! Então, dona Hélia retrucou: - Deixa disso Deí! Não vale a pena você brigar. Ele tinha deixado toda sua paciência de lado... Teve ainda outro que andou pelas ruas chamando Deí de “Cavalo Velho”, mas esse não teve a coragem de mostrar a cara.

Superando estes casos menores, tanto Deí como dona Hélia ganharam vida em suas “quase” terceira idade. Hoje eles se completam, driblando os inconvenientes com muita tranqüilidade.


O menino do Liceu: Carlos Benites de Azevedo



12 de dezembro de 2006, 10 horas, Igreja Porciúncula de Santana. Conferi o papel em que anotara o comunicado publicado na comunidade do Liceu Nilo Peçanha convidando para a cerimônia que celebrava os 50 anos de formatura da turma Ginasial de 1956 do famoso colégio niteroiense. Ingressei no Liceu 20 anos após aquela turma iniciar o Clássico ou Científico, que era o equivalente ao atual Ensino Médio. Só a forte ligação que sempre tive com o colégio me fazia ir a uma cerimônia em que não conhecia nenhum dos presentes. Chegando lá, fiquei a observar aqueles jovens senhores, tentando imaginar que vida teria levado cada um deles após deixarem o Liceu. Minha timidez fez com que ninguém soubesse de minha presença.  Nos dias seguintes, vários daqueles agora já vovôs e vovós tomaram de assalto a internet e passaram a comentar sobre o encontro na  Igreja e os causos da época em que estudaram, com uma memória prodigiosa com relação a nomes e fatos. E como escreve bem aquela turma! A cada relato eu ia conhecendo mais sobre eles, e passei a me aproximar com alguns pitacos na conversa. Foi aí que conheci a Nelma, que se emociona sempre que volta ao colégio; Verinha, advogada, porta-bandeira do Colégio nos desfiles na Avenida Amaral Peixoto e rainha do Grêmio, que quando volta a Niterói tem que beber um Mineirinho; Carlinhos, autor de vários contos sobre o Liceu contidos num livro a mim presenteado recentemente; Yara que acompanhou de longe, mas bem próxima pelos laços da internet, a Copa Libertadores de 2008 e ainda Pedrita, Silvio e tantos outros. Ainda tinha minha tia Lecy, que acabei descobrindo que estudara junto com alguns deles. Era a época dos discos de 78 rotações que eram tocados pela turma do Grêmio, onde se ouvia Elvis, Neil Sedaka e The Platters. Porém, a figura que mais me marcou, e possivelmente a todos daquela turma, não estava ali presente.  Manequinho do Liceu, era como ele era chamado. Aliás, Liceu era praticamente um sobrenome de todos ali. Era sempre Fulano de Tal, DO LICEU. O Manequinho estudara antes no Figueiredo Costa, colégio de grande fama, e relutara bastante em ir para o Liceu, mas um primo insistiu tanto que ele acabou  aceitando o desafio, pois o colégio tinha fama de ser mais rigoroso ainda do que o Figueiredo Costa. Assim, ao contrário da maioria que entrava no primeiro ano do Ginasial, ele ingressou no primeiro ano do Científico. Relutou, mas quando entrou, era o mais liceísta de todos. Como uma das meninas me falou, ele parecia aquele que Deus olhou e disse: “Desce lá e arrebenta!”.  Sua beleza era ressaltada até pelos rapazes. Claro que seu talento para o futebol e entusiasmo pelo esporte e música o ajudaram a se destacar, mas seu senso de companheirismo, de congraçamento e de justiça era tão visível que logo ele estava no Grêmio.  Queria participar de tudo.  Se os amigos de Grêmio se doavam 90%, ele era 100%; se os outros conseguiam os 100%, ele arrumava um jeito para chegar a 110%, e fazia tudo sorrindo, como se não fosse nada demais. Os amigos diziam: “você está marcado para grandes feitos!”

No meio dos relatos, eu montava mentalmente cada cena em que o Manequinho se encontrava, o que era facilitado pela profusão de narrativas sobre o mesmo. Quando a memória falhava para o Carlinhos, vinha outro e emendava a continuação. Assim, conseguia enxergá-lo nas viagens, competições esportivas, as reuniões do Grêmio, os embates com o diretor para que permitisse uma atividade não prevista, ou mesmo para defender alunos injustiçados. Mas o tempo ia passando e, como ele era o caçula da turma, alguns amigos saíram do Liceu antes dele. Começou a sentir falta dos amigos já no dia da formatura. Quando o viram chorando no discurso do Professor Baltazar, muitos perguntaram se ele estava emocionado pelas palavras em latim ditas pelo professor. Respondeu com um palavrão e confessou que estava já com saudades deles. Mas um deles, o Carlinhos, mesmo aprovado para a Faculdade de Direito da recém criada Universidade Federal Fluminense, não conseguiu se afastar e arrumou um jeito de permanecer no Grêmio e participar de tudo por mais um ano. Assim, Manequinho ainda tinha o bom companheiro de aventuras, que ultrapassavam os muros do colégio. Mas ele já começou a se preparar, do que faria no pós-Liceu. Diziam que os liceístas tinham duas opções: ou ingressavam nas melhores universidades ou seguiam a carreira militar.  Muitos se assustaram quando souberam que Manequinho se alistara numa unidade do Exército. Diziam que ele não tinha o perfil, que estranharia toda aquela disciplina. Ele só sorria, parecia que não se preocupava com o futuro. Disse então que ele provocaria uma revolução no Exército. “Como você vai abandonar esse topete de Elvis?”, diziam os amigos. “Pois essa vai ser a minha primeira revolução, e em breve todos lá usarão um topetão.” Os relatos que eu ouvia sobre ele diminuíam a partir de seu alistamento, e isso para mim era lógico, pois cada um foi seguindo o seu caminho.. Mas as cenas continuavam a ser montadas por mim. Eu o via claramente. Veio o golpe de 1964. Numa reunião quase clandestina de ex-liceístas, já que reuniões com estudantes não eram muito bem-vistas na época, surgiu a notícia de que dois colegas tinham sido presos, acusados de subversão. Lembraram então que o Manequinho estava no Exército e decidiram pedir sua ajuda. Foram a sua casa no Bairro de Fátima (coincidentemente, próximo de onde eu morei) e lhe mostraram o quadro. Ele ficou de procurar pelos antigos companheiros de Grêmio e que faria o máximo para ajudá-los.  E ajudou-os. Usando o seu poder de convencimento, encontrou um oficial bem graduado que tinha uma posição mais moderada do que a que reinava e os amigos puderam voltar para suas casas. Confrontado pelos amigos pela situação, da qual ele acabava fazendo parte, ele dizia que infelizmente não podia ajudar muitos outros, como os amigos do Grêmio, e que ficava triste com isso. “Eu sou um só”.  Em 1968, o Brasil vivia um momento de grande agitação política, e mais uma vez surge em cena o Manequinho. Houve uma ordem, partida de um militar bem graduado, de que um atentado contra um conglomerado industrial público no Rio de Janeiro fosse impetrado por membros da Aeronáutica e do Exército, com o objetivo de culpabilizar grupos clandestinos de oposição ao regime. Dois militares se insurgiram à ordem, pois não queriam sangue em suas mãos, e ameaçaram tornar pública a história. Um deles era um Capitão da Aeronáutica. O outro era Manequinho. Foram presos por isso, e posteriormente expulsos de suas armas, sendo ameaçados para não contarem nada. Mas ao menos eles conseguiram que a ordem fosse cancelada. Veio a Anistia em 1979, e nada de notícias sobre Manequinho, até que durante a tragédia das chuvas em Niterói em 2010, eu o vejo chorando a morte de algumas crianças. Com a indenização que recebera, pela injustiça que sofrera, Manequinho construiu um centro esportivo para receber jovens carentes, dentre eles, estavam duas crianças do Morro do Bumba.

Infelizmente, o Manequinho não esteve presente nas cenas narradas após maio de 1962. Já no Exército, ele adoecera seriamente e uma leucemia o impediu de realizar os grandes feitos para os quais estava destinado. Talvez não aqueles que apareceram nas cenas montadas por mim, mas certamente tão grandiosas quanto. Me fez lembrar o personagem Nemecsek do livro Os meninos da rua Paulo, que era franzino mas que  acabou tornando-se um herói. Os últimos relatos sobre ele mostravam a Verinha chegando chorando na casa do Carlinhos para lhe dar a triste notícia:

- Morreu, Carlinhos. Ele morreu …

(escrita em agosto/2010 e finalista do Prêmio UFF de Literatura de 2010, e presente na Coletânea do referido concurso, publicada pela EdUFF

5 de novembro de 2012

Quem vai encarar?



Essa não trovo nem travo 
ah, meu DEUS, como é que pode... 
ao invés de um cavalo bravo
Evandro nos traz um bode!

(I)

 
Bééé...
"canta" o bode para a lua,
que não se faz de rogada;
safada, ilumina a rua,
e se deixa ser amada.

(I)

Num sô o tar bódi naum cunciergi!


Enfim encontramos o bode na sala